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Agora que sabemos mais sobre a procura no setor hoteleiro e como ou quem a pode produzir, é hora de descobrir como funciona a procura real do seu hotel (Unconstrained Demand, em inglês) e como a deverá analisar.
Para isso, exploraremos o conceito da “tendência do sobrevivente”, ilustrado com um exemplo clássico da Segunda Guerra Mundial: os bombardeiros do exército aliado.
A “tendência do sobrevivente”: ver mais além do êxito
Durante a Segunda Guerra Mundial, o elevado número de aviões abatidos em combate era um problema crítico. A solução consistia em reforçar as áreas mais vulneráveis dos aviões para aumentar as suas probabilidades de sobrevivência. Para isso, os analistas examinaram os danos sofridos pelos bombardeiros que retornavam à base.
À primeira vista, poderia parecer lógico reforçar as áreas com mais impactos. No entanto, Abraham Wald, um dos analistas, apercebeu-se de um erro crucial: esses impactos representavam as áreas menos críticas, já que os aviões com danos nessas partes conseguiam regressar. Para aumentar a sobrevivência, era necessário reforçar as áreas que não mostravam impactos, já que esses eram os danos que haviam causado a queda dos aviões:
Esse raciocínio é um exemplo clássico da “tendência do sobrevivente”, que ocorre quando se consideram apenas os casos de sucesso, ignorando os fracassos.
Aplicação à análise da procura real em hotéis
O que têm a ver os bombardeiros das tropas aliadas da Segunda Guerra Mundial com a procura do seu hotel? Mais do que poderá imaginar.
No contexto hoteleiro, a “tendência do sobrevivente” leva-nos a considerar apenas as vendas realizadas («sucessos»), sem levar em conta as oportunidades perdidas («danos críticos»). Para obter uma visão completa da procura real do seu hotel, é necessário analisar tanto os sucessos quanto as oportunidades perdidas.
Dessa forma, estes seriam os principais KPIs a serem considerados para calcular a procura real do seu hotel (aproveite ao máximo o seu BI, porque o irá precisar).
- Reservas produzidas: este KPI reflete toda a venda consolidada do seu hotel, fornecendo uma visão clara do que os clientes compram e quando o fazem. É equivalente a analisar os dados com base nos casos de sucesso, marcados a vermelho.
Um bom relatório OTB (On The Books) oferece-nos uma radiografia rápida de toda a venda consolidada e também em quais os períodos se concentra esta procura finalizada em êxito.
- Cancelamentos: embora não constem na produção final, os cancelamentos fazem parte da sua procura real e devem ser analisados detalhadamente. Inclui as razões para o cancelamento, a fim de entender o que motiva a perda de reservas e evitar duplicar dados em casos de rebooking, além de ajudar a detetar padrões aos quais poderá se antecipar.
- Procura sem compra: esta é a peça chave que costuma ser ignorada e que equivale aos “impactos invisíveis” na fuselagem do avião (marcados em azul), que precisará de reforçar para poder aumentar suas vendas ao menor custo possível.
Este KPI é composto pela soma de duas variáveis que deverá considerar:
- Procura atendida sem conversão: por exemplo, um cliente que visita o seu site, encontra disponibilidade para as datas que procura, mas decide não reservar porque o preço parece elevado ou as informações sobre as condições da estadia não são claras. Este indicador permite identificar problemas na experiência do cliente, tais como preços elevados, falta de confiança ou informações insuficientes sobre a oferta, bem como pontos de fricção que podem ser resolvidos nos casos em que os clientes não compraram, apesar de haver disponibilidade.
- Procura não atendida: solicitações não atendidas devido a restrições, limitações de ocupação ou falta de disponibilidade. Este tipo de procura indica áreas onde poderá melhorar a sua capacidade de resposta. Por exemplo, é possível flexibilizar as restrições de estadia ou ajustar a gestão de inventário em datas-chave para não perder oportunidades de venda.
A procura sem compra é essencial, porque reflete tanto as ineficiências quanto as oportunidades de melhoria. Por exemplo, uma alta proporção de procura não atendida pode sinalizar a necessidade de revisar as suas políticas de preços ou disponibilidade. Da mesma forma, um baixo índice de conversão em procura atendida pode indicar que os clientes encontram ofertas mais atraentes na concorrência, ou que sua comunicação não é suficientemente eficaz.
Além disso, ao quantificar esta procura poderá calcular o custo de oportunidade associado. Isso implica ter uma estimativa das receitas potenciais que não foram geradas devido às reservas não concretizadas, levando em conta fatores como o preço médio e a capacidade perdida nos períodos analisados. Este exercício permite ter uma estimativa das receitas potenciais que poderia ter gerado se tivesse convertido ou captado essa procura o que fornece uma base para priorizar ações e estratégias de melhoria, alcançando um retorno maior de maneira mais imediata
Analisando estes KPIs, conseguirá ter uma visão completa da procura real do seu hotel. Dessa forma terá a possibilidade de capitalizar mais por meio de ações que dependem exclusivamente de si.
Uma vez que tem todos os dados, como deve reforçar o “avião” da procura? Sem dúvida, deve abordar os seguintes pontos:
- Mapa de procura: crie um calendário detalhado que identifique padrões cíclicos, picos, quedas e momentos críticos de vendas. Este “mapa” permitirá que se antecipe, planeie e alinhe os seus preços, restrições e ações de marketing com a procura real, e não com uma procura aparente.
- Revisão de restrições e tarifas: ajuste as estadias mínimas e restrições em momentos de menor procura para captar a que está sendo perdida. Poderá também aplicar aumentos tarifários para estadias curtas em datas-chave, maximizando a margem e evitando saturar o seu inventário demasiado cedo.
- Otimização de inventário: se já sabe que haverá uma procura mais rentável a curto prazo, não preencha o hotel muito cedo com tarifas baixas. Antecipe esses cenários e reserve inventário para segmentos com maior poder de gasto ou para datas de alta procura confirmada.
- Monitorização da conversão: detete variações significativas na sua taxa de conversão. Um aumento pode indicar uma oportunidade que não está a aproveitar; uma queda pode sinalizar um problema nos preços, disponibilidade ou experiência do usuário.
- Preços competitivos: garanta que seu canal direto não fique atrás de outros canais. Hoje, mais do que nunca, o cliente compara. Se o seu preço direto não for competitivo, poderá perder a conversão.
- Controlo de cancelamentos: combine tarifas flexíveis com não reembolsáveis para minimizar cancelamentos. Assim, equilibrará a necessidade de oferecer flexibilidade sem comprometer o seu inventário nem arriscar receitas já garantidas.
- Campanhas táticas no momento certo: crie ações promocionais ou campanhas quando a procura estiver presente. Não desperdice esforços promocionais em períodos de baixa procura ou com restrições excessivas.
Conclusão
Compreender a procura real do seu hotel é muito mais do que contar reservas consolidadas. É analisar todo o panorama: sucessos, falhas e oportunidades perdidas. Com esta perspetiva global, livre da “tendência do sobrevivente”, poderá ajustar a sua estratégia e maximizar os resultados sem a necessidade de investir mais em visibilidade ou fluxo de visitantes.
Os hotéis não produzem procura por si mesmos; eles dependem de um ecossistema turístico que a impulsiona. A pergunta chave é: está a aproveitar ao máximo a procura que já possui antes de procurar gerar mais? Analisar e otimizar a procura sem compra pode fazer a diferença. Ajuste as suas regras de distribuição, redefina os preços e melhore a gestão de inventário e restrições. Dessa forma, obterá maior valor da procura existente, aumentando vendas e rentabilidade sem custos adicionais.
Na terceira (e última) parte desta série, exploraremos onde e contra quem a venda direta compete para capitalizar toda a procura disponível.