Javier Delgado7 minutos de lectura

Tecnologia e turismo: uma viagem através dos séculos

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historia tecnologia e turismo miraiNesta publicação, queremos ganhar perspetiva e analisar, a partir de uma perspetiva histórica, a influência e relação da tecnologia com a indústria do turismo desde os seus primórdios até aos dias de hoje. Vamos começar.

As origens do turismo

A indústria hoteleira e do turismo são tão antigas como a própria humanidade, uma vez que o homem viaja por natureza e necessidade desde o início dos tempos. Se analisarmos o comportamento humano do ponto de vista histórico em relação às viagens e ao alojamento, podemos verificar que a indústria das viagens e da hotelaria têm estado, estão e estarão sempre intimamente ligadas à tecnologia. 

No século IV, a Tabula Peutingeriana já representava itinerários das antigas calçadas romanas. Podemos falar das primeiras encarnações de guias de viagem ou uma versão muito precursora do que hoje todos conhecemos como Google Maps. 

As cruzadas, consideradas por muitos como as primeiras organizações de grandes viagens em grupo, embora motivadas pela religião e geopolítica, também dependiam da tecnologia para serem bem-sucedidas.

Aquando da descoberta da América pela coroa espanhola no final do século XV, ferramentas tecnológicas básicas como o astrolábio ou a balestilha, foram determinantes para o sucesso daquela empreitada que mudou o mundo. Poucos anos depois, já no século XVI, Espanha aprimora e alcança os níveis máximos de profissionalização da navegação marítima, publicando obras fundamentais como “Arte de navegar” de Pedro Medina ou “Breve compêndio da Esfera” de Martín Cortes de Albacar. Ambos são espanhóis quase desconhecidos, embora tenham feito grandes descobertas, como a declinação magnética da Terra ou a medição da altura dos astros. 

É também no século XVI que as classes mais abastadas inglesas começam a organizar as Grandes Viagens (Grand Tours) pelo sul da Europa, especialmente pela Itália renascentista, como parte da sua formação.  

Séculos XVIII e XIX: nascem os Operadores Turísticos

No século XVIII, as Grandes Viagens (Grand Tours) já são algo comum entre as classes abastadas europeias e propiciam uma inovação determinante: os travellers checks. Um meio de pagamento ou câmbio de moeda nominativo, que permitiu viajar sem ter de levar consigo montantes em dinheiro. Voltaremos mais tarde ao tema dos meios de pagamento e da sua influência na comercialização. 

Ao longo do século XVIII, especialmente em Inglaterra, a máquina a vapor desenvolveu-se, proporcionando um crescimento económico sem precedentes para o mundo ocidental. Como consequência deste desenvolvimento económico e social no século XIX, o ser humano começa a querer “viajar por prazer” de forma mais ou menos massiva.

Em julho de 1841, o Sr. Thomas Cook organizou em Leicester a primeira excursão de comboio até Loughborough. Curiosamente, aquela viagem, na qual viajaram 500 pessoas, tinha como objetivo participar numa manifestação contra o consumo de álcool. Podemos dizer que naquele verão de 1841 nasceu a operação turística.   

Em 1855, Thomas Cook organizou o primeiro tour continental que incluiu alojamento e pensão, visitando a Alemanha, a França e a Bélgica. Dez anos depois, abre a primeira loja física na Fleet Street, muito perto de Covent Garden. Ali vendia bilhetes de viagem, guias de viagem, calçado e peças de bagagem. Adicionalmente, as Grandes Viagens (Grand Tours) começam a ser comercializadas como Cooks Tours. Une-se o conhecimento específico (know how) a processos tecnológicos e de negócio para criar um produto. Esta é, portanto, uma das primeiras ações de marketing da história na indústria do turismo.      

No período entre guerras, em 1923, na região que era então a Prússia, foi fundada a empresa Preussag, que se dedicava à mineração, aço, petróleo e imobiliário, embora também à impressão. A impressora produzirá o folheto que será o principal veículo de distribuição hoteleira durante décadas. A empresa Preussag, com tecnologia avançada em diferentes áreas, será o embrião do atual grupo TUI. 

Em 1927, nos EUA, o Sr. Marriott abriu um pequeno bar de refrescos com nove lugares em Washington D.C. Nascia então a que hoje é a maior empresa hoteleira do mundo.  

Anos 40 – 90: a grande expansão

A Segunda Guerra Mundial redefine o mundo a nível geopolítico. Uma das consequências da guerra é que, após a mesma, gera-se um grande excedente de material militar, incluindo aviões, ambulâncias, autocarros e outros elementos essenciais para o transporte coletivo. No final dos anos quarenta, em Inglaterra e noutros países do norte da Europa, começam os primeiros pacotes turísticos fechados para destinos mediterrâneos. Estes pacotes são operados em aviões de origem militar e, em muitos casos, os passageiros em terra são transportados em veículos que sobraram da guerra. 

Nos anos 50, considera-se que o turismo em grande escala começou com o desenvolvimento dos primeiros grandes destinos turísticos do Mediterrâneo. Nascem e crescem então as grandes cadeias hoteleiras. Em Espanha, a família Riu abriu o Hotel San Francisco em 1953 e o Sr. Gabriel Escarrer arrendou o seu primeiro hotel em 1956. Nos EUA a família Marriott começa a sua grande expansão de motéis. 

As décadas entre 1960 e 1990 são de um desenvolvimento frenético. As grandes cadeias hoteleiras crescem (a Accor é fundada em 1967), os destinos turísticos emergentes consolidam-se e surgem novos destinos. No final do século passado, o turismo tornou-se uma das principais indústrias globais. 

Paralelamente, nos EUA nasce, em 1949, o cartão de crédito, que se tornará uma peça determinante para o comércio mundial, especialmente para o turismo. Da mesma forma, a indústria aérea cresce de forma exponencial devido à forte procura por viagens de lazer. É por isso que, em 1957, a American Airlines criou o embrião do que será o primeiro Sistema Global de Distribuição (GDS). Em 1964, nasce oficialmente o SABRE (Semi Automated Business Research Environment), um sistema criado pela IBM para a American Airlines para gerir o enorme e crescente volume de transações de reservas aéreas. Em 1978, foi fundada a Southwest Airlines, sendo a primeira companhia aérea de baixo custo da história. 

Em 1978, a SABRE abre-se como plataforma para agentes de viagens para a distribuição de inventário, primeiro aéreo e, posteriormente, hoteleiro. Em 1987, algumas companhias aéreas europeias criaram a Amadeus como uma plataforma de gestão de inventário e distribuição. 

Anos 90: início da Grande Revolução

Dada a quantidade de eventos a destacar a partir dos anos 90, passamos a listar anos específicos com os eventos históricos mais relevantes:  

  • 1991: A Mirai é fundada em Espanha e a Hotel Reservations Network (HRN, precursora do que seria o website Hotels.com) é criada nos EUA. A HRN apenas vendia noites de hotel por telefone. 
  • 1995: A Mirai regista o domínio hotelsearch.com e cria um dos primeiros diretórios de hotéis do mundo, evoluindo pouco depois para um modelo de agência de viagens online (OTA). No mesmo ano, a companhia aérea Easyjet foi fundada no Reino Unido, vendendo apenas lugares por telefone, cujo número estava rotulado na fuselagem do avião. 
  • 1996: A Booking.com é fundada em Amesterdão, que tentou anunciar o seu website (URL) no principal jornal holandês e não foi permitido porque só aceitavam telefones. Entretanto, nos EUA  nasce a Expedia no seio da Microsoft.
  • 1997: A Preussag compra a Hapag Lloyd, movimento precursor da integração vertical aviação – agência – hotel e serviços no destino. 
  • 1998: A Mirai completa a primeira transação de uma reserva hoteleira 100% “online”. Neste mesmo ano é fundada a Google nos EUA.
  • 1999 – 2000: nasce o grupo TUI (resultado da fusão da Preussag com a Thompson) que se estabelece como o principal grupo turístico da Europa. Nos EUA, dada a dificuldade de encontrar conteúdos de qualidade e relevância na web para organizar uma viagem, Steve Kauffer funda o Tripadvisor. 

Início do século XXI

  • 2001: ataques terroristas de 11 de setembro em Nova Iorque. A Expedia (USA Networks) adquire o hotels.com. Fundação da Hotelbeds (no seio da First Choice, parte do grupo TUI). A indústria turística mundial pára abruptamente e os hotéis ficam quase vazios. As OTAs começam o seu crescimento exponencial e ganham participação na distribuição do hotel. 
  • 2011: a Google lança o produto Hotel Finder e o Google Flight Search como ferramentas específicas para Travel, para enriquecer os resultados aos utilizadores. 
  • 2019: falência da Thomas Cook após 178 anos de operações. 
  • 2020-2021: é declarada a pandemia COVID-19. A hotelaria mundial pára quase por completo. 
  • 2022-2023: a indústria do turismo e hotelaria retoma a sua atividade, atingindo os maiores números globais de viajantes, ocupação e preço da história. O Booking.com ultrapassa os 100 mil milhões de capitalização bolsista. 

Conclusão

A indústria hoteleira tem vindo a crescer e a evoluir constantemente ao longo dos séculos. A oferta e a procura têm crescido de forma exponencial, criando uma das primeiras indústrias do mundo, especialmente nas últimas décadas. 

A distribuição tem sido um dos principais desafios históricos do hotel, por isso grandes grupos têm crescido neste campo. Historicamente, a tecnologia tem sido um fator fundamental no desenvolvimento da distribuição. Olhando com perspetiva, evidencia-se que a proximidade e o conhecimento do cliente emissor, a capacidade e rapidez de comunicação, o valor da marca, o acesso à disponibilidade e preço têm sido, são e serão as chaves da venda. 

O marketing combinado com a tecnologia permitem hoje ao hoteleiro realizar estas tarefas de forma direta e eficiente. Este novo contexto permite que o hoteleiro possa ser mais forte comercial e financeiramente, se assim o desejar. No entanto, se não aproveitar esta oportunidade, estará obrigatoriamente sujeito a terceiros para executar o seu modelo de negócio, entregando grande parte do valor da sua conta de resultados.